quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Te liguei

Te liguei uma, duas, três vezes. Mentalmente, claro. Imaginei todo o diálogo contigo. Tinha já ensaiadas as minhas falas e as tuas. A nossa conversa iniciaria insegura, como todo amor novo é. Mas teria o encantamento daquilo que se descobre. Falaríamos de política, xingaríamos a inércia do povo, discutiríamos literatura, descobriríamos amores em comum, tentaríamos advinhar as músicas preferidas uma da outra e confessaríamos aqueles gostos musicais mais duvidosos que todo mundo tem. Riríamos falando sobre as séries que já vimos, e encontraríamos o fato incomum de que ambas amam filmes antigos e lentos. E leríamos em voz alta o poema preferido de cada uma. Quando chegasse a hora de desligar o telefone, perceberíamos, assustadas, como o tempo contou as horas apressado demais. Tentaríamos nos despedir algumas vezes, sem sucesso, porque a vontade de continuar conversando seria maior do que a necessidade de desligar. E quando finalmente a hora nos cobrasse uma despedida, desligaríamos o telefone com a vontade uma da outra na boca e no peito. 

Te liguei uma, duas, três vezes. Mentalmente, claro.  

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